quarta-feira, abril 26, 2017

Evangélica, ex-diarista resgata mais de 200 crianças da pobreza e do tráfico


Por mais de 20 anos, Marlene foi diarista, mas, no final da década de 1990, trabalhava em uma padaria. Um dia, em 1995, levou os pães que sobraram para a favela e distribuiu –formou-­se uma fila enorme.

Com a ajuda da filha, Vanessa Garcia, 33, ela levou as crianças para a igreja evangélica. Conseguiu aulas de teatro e de música. “Mas uma hora eu percebi que elas queriam mesmo era comer, porque não tinham comida em casa.”

Marlene então começou a pedir alimentos para conhecidos, como as ex-patroas e comerciantes. Dava comida até em garagens da favela. Quando viu, já tinha quase 200 crianças no seu pé.

TRÁFICO E MORTE

No fim dos anos 1990, o Morro da Macumba sofria com uma guerra entre traficantes. Quem viveu na favela na época conta que as crianças eram usadas como soldados, ou como escudos. Morriam.

Assim como o tráfico, a fome também fazia vítimas. Nos anos 2000, um garoto caçava latinhas em uma avenida de Interlagos, bairro onde fica a favela. Ele tinha 13 anos e era responsável pelos irmãos menores –a mãe é alcoólatra. Foi atropelado por um taxista que estava atrasado para uma entrevista de emprego.

Outros dois meninos morreram em cenas parecidas. “Eu via as crianças fazendo malabares no farol, pedindo batata frita no McDonald’s, revirando o lixo do Extra”, conta Marlene. “Vi que todas as crianças iriam morrer”.

Marlene e Vanessa encontraram, em 2005, um galpão na topo da favela, mas o local era usado como ponto de tráfico e cativeiro de sequestros. “Falamos com os traficantes, mostramos o nosso projeto”, lembra Vanessa. Eles toparam sair e o dono oficial do espaço também cedeu à vontade de Marlene.

PROJETO REVIVER

O projeto tem auxílio de outros: empresários pagam as contas, doam comida, amigos ajudam a limpar, a Pastoral da Criança doa metade dos alimentos. As crianças, que passam quatro horas do dia no galpão, têm reforço em matemática e português e aulas de inglês e francês (dada por voluntários). Brincam quase o tempo todo: na região há um grande shopping, mas poucas áreas públicas de lazer.

Quando uma criança cresce, costuma voltar para ajudar o galpão –várias já estão se formando na faculdade. Há 12 anos, o projeto virou oficialmente a ONG Reviver, que não recebe um centavo de nenhum governo, pois “políticos não entram”.

VALE DE OSSOS SECOS

Evangélica, Marlene usa uma imagem bíblica para explicar o nome da ONG: “Reviver é como se você estivesse num vale de ossos secos. Você faz força para levantar. Então você levanta. Revive e vai procurar emprego”

Aos 59 anos, Marlene é um exemplo de compaixão e solidariedade. Seu coração altruísta e sua empatia pelas vítimas da extrema pobreza foram a força-mor para a fundação deste grande projeto.

“Tenho muito dó de criança, não sei por que, começou do nada. Vejo uma com fome, pobrezinha, quero trazer para cá”, diz Marlene, hoje “mãe” de 230 crianças carentes que são alimentadas, bem cuidadas e instruídas nos caminhos do Senhor.

Com informações da Folha de São Paulo