Há quem diga que a teologia da “graça” é uma doutrina exclusiva do Novo Testamento. De fato, o novo pacto versa quase que inteiramente sobre este tema. Mas, deve-se compreender que a Graça de Deus foi revelada ao homem desde os primórdios da humanidade. O Antigo Testamento nos oferece várias passagens nas quais vemos a assinatura da graça. Foi à graça de Deus que poupou a vida de Noé e de toda a sua família no incidente do dilúvio, foi esta graça que encontrou Abraão e brindou-o com a benção de ser pai. Mesmo diante da dúvida e do riso irônico de Sara, a graça sempre relutante perseverou no propósito de fazer de Abraão e Sara pais de Isaque e macro-progenitores da nação de Israel.
Foi esta graça que encontrou com Jacó, no Vau do Jaboque. Um homem fugitivo, que andava errante pelo caminho, deixara sua casa para vaguear pelo mundo fazendo das estrelas o seu teto, das estradas o seu leito. Um homem que enganara os seus próprios familiares e carregava na sua identidade o título de usurpador, pois este era o significado da sua vida. Seu nome era o espelho de sua vida. Jacó tinha dinheiro, tinha o direito de primogenitura, mas não tinha direito de dizer que merecia ser perdoado. A história de Jacó era crivada de engano e de mentira. Entretanto, nesta história há um capítulo onde a graça de Deus se manifestou e no Vau de Jaboque Deus mudou o nome e a vida de Jacó. Depois de ter vivido uma vida inteira nas trevas, o sol nasceu e a luz brilhou no seu caminho. Jacó saiu daquele encontro manquejando, mas estava com a alma livre. Isto é graça!
No Antigo Testamento, Deus se apresenta várias vezes como: “o Deus de Abraão, Isaque e Jacó”. Porque Deus não opta em desassociar-Se do nome de Jacó, cujo significado é usurpador? Talvez ficasse melhor dizer “Deus de Abraão, Isaque e Israel”. Por que a persistência em dizer que Ele é o Deus de Jacó? Creio que é pelo motivo que as pessoas precisam entender que o Senhor dos Exércitos não é apenas Deus dos grandes heróis, dos patriarcas, dos homens de fé, mas também é Deus do fraco, do usurpador, daquele que vive no engano. O Deus de Jacó é o Deus da Graça!
Foi à graça de Deus que escolheu Moisés, um assassino fugitivo para ser o libertador de Israel. Em meio à quietude do deserto de Mídia, a Glória de Deus inflamou a sarça enquanto a Sua Graça incendiava o coração de Moisés. Um homem que tinha dificuldade para se expressar, tornou-se o locutor e porta-voz de Deus na narrativa do Êxodo. Fico pensando, o que Moisés fez para merecer esta oportunidade? Na verdade, só encontro motivos que me fazem ver o que Moisés fez para não receber esta oportunidade: (1) matou um homem e enterrou o seu corpo na areia, (2) se precipitou na tentativa de ser o líder do seu povo antes da hora, (3) abandonou a sua família e seu povo durante 40 anos fugindo para o deserto de Mídia e talvez, se não fosse por Deus, pode-se conjecturar que Moisés nunca mais colocaria os pés no Egito. Mas, a graça relutante de Deus simplesmente vem sobre o ser humano sem olhar o mérito. Por que se fosse por merecimento, ninguém receberia nem um exemplar da bênção divina. “Todos pecaram”! (Rm 3.23). Foi à graça de Deus que conduziu o povo de Israel durante a peregrinação no deserto, apesar das murmurações e constantes inclinações a práticas idólatras, o amor de Deus superou os erros dos descendentes de Abraão e os levou a terra prometida.
Observo a graça nas linhas e letras contidas no Antigo Testamento. Foi esta graça que poupou a vida de Elias quando amedrontado na caverna e encavernado no medo almejava a morte. Elias o destemido profeta mostrara a sua face frágil e a graça de Deus não se escandalizou, porque a graça se fortifica na fraqueza. A graça tirou Elias da caverna e o livrou de um término de ministério melancólico, preparando-o um final glorioso digno de um profeta de sua envergadura. Por causa da graça, a última menção bíblica de Elias não foi um fim depressivo, regado de medo e recheado de uma sensação de desamparo em uma caverna, mas sim, um remate augusto, maravilhoso e pirotécnico. Elias não viu a morte que pedira em I Reis 19.4. A graça relevou as palavras de Elias quando no ápice da tribulação sua visão embaraçou por causa das intempéries agudas que afligiram a sua alma. A graça não deu a morte que Elias pedira. Pelo contrário, livrou-o da morte, mostrando que a nossa fraqueza não anula a graça, mas a fortifica. O final de Elias não é em uma caverna, mas sim, com uma comitiva celeste que desceu a terra para fazê-lo subir ao encontro de seu Deus. Elias se despede subindo! Um carro de fogo com cavalos de fogo traz fulgor, brilho e glória no término do ministério profético de um homem marcado pela Graça.
Foi esta graça que levou Davi ao trono. Fico pensando quais os critérios de Deus utilizados na escolha de Davi. É fácil escolher Davi depois do episódio de sua luta contra Golias, é fácil escolher Davi depois que o povo israelita cantava louvores enaltecendo os seus feitos, dizendo: Saul matou os seus milhares, Davi matou os seus dez milhares. Qualquer um poderia escolhê-lo depois destas coisas e foi assim que os homens o escolheram para ser rei sobre eles. Mas Deus, movido pela graça, escolheu-o antes de triunfar sobre Golias, antes de ser uma celebridade nacional, antes das cantigas serem estreladas com o seu nome.
É fácil escolher Davi depois do mérito, é fácil felicitar um guerreiro depois da vitória. A graça acreditou e creditou em Davi antes do merecimento, porque a graça é favor imerecido. Antes de tudo, a graça microscópica de Deus enxergou Davi. Aquele jovem estava no anonimato, distante do burburinho das cidades urbanas, e no silêncio das pastagens, ouvindo a melodia dos ventos que sussurrava em seus ouvidos quando deitado em verdes pastos apresentava ao seu Deus louvores poéticos e proféticos, a graça divina encontrou aconchego nos braços do menino Davi. Corpo de menino, coração agigantado! Seu coração transbordava de prazer em dedicar horas de sua humilde existência a um Deus que era o centro de sua vida, a órbita de sua adoração. Pronto, Davi estava na mira da Graça! Um jovem que preenchia as fileiras do anonimato foi encontrado pela graça microscópica de Deus e tornou-se rei de Israel. Confesso que até hoje não consigo entender plenamente os critérios da graça, mas vejo-a nitidamente presente na trajetória do menino Davi, do líder Moisés, do patriarca Abraão, do versátil Jacó, do intrépido profeta Elias e etc; vejo-a nitidamente nas páginas do Antigo Testamento.
Postado por Pastor Israel Trota