A oração modelo, ensinada por Jesus no Sermão do Monte, em Mateus 6.9-13, nos faz saber que a oração é um exercício espiritual divino humano. Basicamente, a oração se espraia nessas duas coordenadas, que em hipótese alguma podem ser invertidas. Significa que, a oração é um exercício primeiramente divino e, ato contínuo, externando-se nos relacionamentos humanos. Vale dizer que, a oração não pode ser tão somente um exercício de comunhão com Deus e nem tão somente um exercício de relacionamentos humanitários. Impossível é também imaginar que a oração inicie pelos relacionamentos humanitários e produza como consequência a comunhão com Deus. É exatamente o que passamos a expor, aclarando o tema acima.
Em todos os períodos da historia da humanidade, sempre houve ascetas, que enfatizaram muito a verticalidade da oração, preocupando-se, até mesmo em demasia, nos exercícios espirituais, inclusive mortificando seus corpos. O ascetismo tem sido desenvolvido por religiosos que têm se enclausurado nos conventos, têm se dedicado sobremaneira a orar nos montes, jejuns e mais jejuns, vigílias e mais vigílias de oração, além de todos os métodos que esses religiosos podem encontrar para reuniões secretas e mortificações físicas, em favor dos exercícios espirituais de oração. Em nada sou contrário aos ascetas, mesmo porque Moisés esteve com Deus, em jejum por duas vezes, durante quarenta dias e quarenta noites (Êxodo 24.18 e 34.28), também Daniel jejuou durante vinte e um dias (Daniel 10.2 e 3), como também Jesus foi conduzido pelo Espírito Santo ao deserto, onde esteve em jejum e oração, durante quarenta dias e quarenta noites (Mateus 4.02). Percebemos que João Batista era caracterizado pelo ascetismo – Mateus 3.1 e 4; Lucas 7.33. Jesus declarou a necessidade de oração e jejum, na libertação espiritual – Mateus 17.21. Paulo jejuava e se dedicava a vigílias – Atos 14.23; 2 Coríntios 6.05 e 11.27.
Durante os dois milênios de história da Igreja de Jesus Cristo, sempre tem havido perseguições aos cristãos, inclusive perseguições bem acentuadas em determinadas épocas e em determinadas regiões da Terra. Principalmente nesses períodos de perseguições religiosas, sabemos que muitos cristãos e líderes espirituais se viam obrigados a permanecer no anonimato, a fim de que conseguissem sobreviver e testemunhar de Jesus, evitando ser mortos prematuramente pelos perseguidores. Nessas circunstâncias, a comunicação entre os cristãos tem sido feita por símbolos e sinais (como por exemplo no apocalipse de João, exilado na ilha de Patmos), tem se multiplicado as igrejas em cavernas e igrejas subterrâneas. Esses cristãos e líderes perseguidos têm se preocupado com a verticalidade da oração, comportando-se como ascetas, proporcionando até mesmo profundas e reconhecidas experiências, que têm sido testemunhadas através dos séculos. Além de Moisés (que escreveu os livros bíblicos de Jó, Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio, enquanto conduzia aproximadamente três milhões de pessoas através do deserto, durante quarenta anos), do apóstolo Paulo (que escreveu livros bíblicos, estando em cadeias romanas), João (que escreveu o apocalipse), muitos outros escritos têm sido registrados por esses ascetas perseguidos. É a referencia do hino nº 126, da Harpa Cristã : “os mais belos hinos e poesias, foram escritos em tribulação e do céu as lindas melodias se ouviram na escuridão”. Percebe-se que o ascetismo corretamente praticado é uma bênção.
Infelizmente, falsos religiosos tentam praticar o ascetismo ou a verticalidade da oração, com exercícios espirituais, sem fundamento na Bíblia. Isso é perigosíssimo. Nesses falsos ascetismos, as pessoas entram em êxtase, através de meditações transcendentais, experimentam visões e sonhos com produção espiritual falsa, tornando-se médiuns de entidades malignas. A humanidade tem se desviado de Deus pelos ascetismos desses falsos religiosos, espíritas e espiritualistas, que praticam essas experiências, sem se basearem na Palavra de Deus. Essa verticalidade da oração é um desastre, como está declarado por Deus em Deuteronômio 18.9-12.
Por outro lado, a humanidade está repleta de muitos que horizontalizam demasiadamente as orações. São aqueles que praticam filantropias, pensando em estar agradando a Deus com suas boas obras, entendendo que, por cuidarem dos carentes próximos, já estabeleceram comunhão com Deus e já se exercitaram em suas orações, julgando ser isso suficiente para sua vida espiritual, no que se acham tantas vezes frustrados. Entre esses que horizontalizam as orações, também estão muitos cristãos, membros e até mesmo líderes das igrejas evangélicas, que se dedicam ao ativismo eclesiástico, julgando que por muito trabalharem em suas igrejas, pelos ofícios ministeriais e cargos de liderança, pelos programas especiais por eles apresentados, enfim, por estarem sempre dispostos a arregaçarem as mangas e trabalharem na Obra de Deus, já por isso mesmo estão em freqüente oração, julgando que com o ativismo eclesiástico estão garantindo a comunhão com Deus. Todos esses e outros ativistas se esquecem de que a oração não é um exercício originalmente horizontal e humano, e sim, um exercício originalmente vertical e divino. Esses ativistas também vivem espiritualmente frustrados, esquecendo-se do que Paulo declara em 1 Timóteo 4.08. “Pois o exercício físico para pouco é proveitoso, mas a piedade para tudo é proveitosa, porque tem a promessa da vida que agora é e da que há de ser”.
Verdade é que, o ascetismo é importantíssimo, mas há de ser seguido pelas práticas horizontais. Não pode haver verticalidade na oração, sem resultados práticos na vida cristã e nas relações interpessoais. Como também impossível é a horizontalidade da vida cristã, sem a verticalidade do ascetismo da comunhão com Deus. É exatamente como um ângulo reto, cujo poder procede de uma linha vertical descendente do ascetismo espiritual da comunhão com Deus pela oração, desenvolvendo-se um vértice dentro da experiência daquele cristão que ora e, conseqüentemente, projetando-se horizontalmente na vida cristã e nas relações interpessoais, como resultado da vida de oração. A causa original há de ser sempre vertical e jamais horizontal. Basta comparar João 8.12 com Mateus 5.16, como também 1 João 1.7.
Observamos que, ao ensinar o modelo de oração no Sermão do Monte, conforme Mateus 6:9-13, Jesus estabeleceu exatamente esta ordem de verticalidade original da oração (pelos detalhes da comunhão com Deus) proporcionando como resultados a horizontalidade da oração (pelos detalhes da comunhão com o próximo). Verificamos a verticalidade da comunhão com Deus, no modelo da oração de Jesus: 1) O Deus da Oração; 2) Importância do “Nome de Jesus” na oração; 3) O “Reino” da oração; 4) A oração e o centro da vontade de Deus. Igualmente anotemos a horizontalidade das relações com o próximo, no modelo da oração de Jesus: 1) Oração pelo quotidiano; 2) A oração e as relações interpessoais; 3) Libertos pela oração. A essa altura, observamos que esse modelo de oração, ensinado por Jesus, focaliza a necessidade de, primariamente, objetivarmos nossa comunhão direta com Deus e, ato contínuo, nosso relacionamento com as pessoas, concluindo, com uma Doxologia ao nosso Deus.
A Bíblia traz vários textos, declarando a necessidade original da verticalidade da comunhão com Deus, a fim de que consigamos a horizontalidade conseqüente da vida espiritual e da comunhão com o próximo. É o que Deus ensinou a Abraão em Gênesis 17:1, exigindo que, primeiramente, Abraão andasse na sua presença para, conseqüentemente, ser perfeito. Em Gênesis 25.29-34, percebemos que Esaú, tolamente, desprezou a verticalidade da primogenitura, que o próprio Deus lhe concedeu, preferindo a horizontalidade do apetite daquele prato de lentilhas, oferecido por Jacó; isso é um exemplo do que fazem tantas pessoas, ao enfatizarem demasiadamente os interesses materiais deste mundo e se esquecerem de dar primazia à comunhão com Deus. Em Êxodo 23.25 Deus ensinou que o suprimento das necessidades e a cura das enfermidades dependem de, primeiramente, servir ao Senhor. Em Josué 1.08, é estabelecida a ordem exata das relações entre Josué e Deus, observando-se primeiramente a necessidade de Josué valorizar a Lei de Deus para, conseqüentemente, ter sucesso na vida: 1) “Não cesses de falar deste Livro da Lei”; 2) “medita nele dia e noite”; 3) “para que tenhas cuidado de fazer segundo tudo quanto nele está escrito”; 4) “então, farás prosperar o teu caminho e serás bem-sucedido”. A mesma ordem da verticalidade da comunhão com Deus, trazendo como posterior conseqüência o progresso da vida humana, como está em Josué 1.08, é apresentada em Salmos 1.02 e 03. Em Mateus 22.38 e 39, Jesus declarou que, primeiramente, temos que estabelecer a relação vertical de amor a Deus, para, só posteriormente, estabelecer a relação horizontal de amor ao próximo.
É intrínseca e necessária a verticalidade e a horizontalidade da oração. Se alguém experimenta comunhão com Deus, naturalmente adquire comunhão com o próximo. Por outro lado, impossível é exercitar a comunhão com o próximo sem, primariamente, a comunhão com Deus, conforme 1 João 4.20. Rui Barbosa escreveu a página, intitulada: “Oração e trabalho”, declarando que ambos são como dois remos do barco; sendo que, se o remador usar apenas um remo (como a oração ou o trabalho, isoladamente) o barco vai desenvolvendo um círculo e jamais avançará adiante; obviamente que o barco só progredirá seu caminho, se o remador usar os dois remos, ao mesmo tempo. Não há oração (comunhão vertical com Deus) sem naturalmente aparecer o trabalho; como também não há trabalho (relação vertical com o homem) sem ter originado da comunhão com Deus pela oração.
Em hipótese alguma, podemos desenvolver uma vida cristã unilateral. Que Deus nos abençoe nesse sentido da prática da oração divino-humana!