A história conta-nos uma viagem de Jerusalém até Jericó, descendo a Wadi Quelt. São cerca de 24 Km, através de uma região de deserto rochoso. Mas a história em causa trata de uma viagem mais profunda. A palavra que Lucas emprega para “viagem” é a mesma (hodos) que emprega para fé cristã, “o Caminho”. A parábola é um caminho que transforma a nossa compreensão de Deus e do ser humano.
Qual destes três te parece ter sido o próximo daquele que caiu nas mãos dos ladrões ?
O doutor da lei pergunta: “Quem é o meu próximo?” E no fim, Jesus coloca uma questão diferente: “Qual dos três mostrou ser o próximo do homem que caiu nas mãos dos ladrões?” A pergunta do doutor põe-no a ele no centro. Quem é o seu próximo? Mas a parábola transforma a pergunta: é o homem maltratado que é, agora, o centro. Quem foi o próximo dele?
Viagem radical
A viagem mais radical que cada ser humano tem de fazer é a da libertação do egoísmo. Começamos esta viagem quando ainda bebés. O bebé recém-nascido é o centro do seu próprio mundo. Crescer é a lenta descoberta de que outros existem e que não existem só para fazer a vontade dele. Por trás do seio há uma mãe. Tornamo-nos plenamente humanos na medida em que aprendemos a ceder o centro a outros.
Para cada um de nós, pois, o maior desafio da vida é deixar de ser o centro do mundo. É uma verdade que se conhece intelectualmente, mas que é muito difícil de praticar. E penso que é particularmente difícil na sociedade contemporânea. A modernidade consagrou a imagem do ser humano como essencialmente solitário, desapegado dos outros, livre de obrigações, descomprometido. É o ego da sociedade consumista. Mas, por toda a parte, na aldeia global, podemos ver sinais do triunfo da “Me generation”, a tirania do ego. Como poderemos aprender a ceder e a dar aos outros o centro ?
Um Samaritano, ao passar, viu o homem ferido e ao vê-lo teve compaixão.
A palavra que traduzimos por “ter compaixão” é uma das mais importantes do Novo Testamento. Significa ser tocado no âmago do próprio ser, nas próprias entranhas. É o choque que nos dá a consciência da presença de um outro.
Em Nova Iorque, foi feita uma experiência com um grupo de seminaristas. No programa de formação para a pregação, pediu-se-lhes que preparassem uma homilia sobre a parábola do Bom Samaritano. Deviam preparar os seus textos e em seguida dirigir-se a pé para o estúdio onde o sermão seria gravado em vídeo. Em certo ponto desse percurso, um ator, representando um homem ferido e maltratado, jazia por terra, coberto de sangue, pedindo ajuda. Oitenta por cento dos seminaristas passaram por ele e nem sequer o viram. Tinham estudado a parábola e feito sobre ela belas composições literárias e, no entanto, passaram ignorando-o. Que teremos de fazer para nos abrirmos aos outros ?
Para a maior parte das pessoas, esta profunda consciência do outro ocorre, da maneira mais forte, quando nos apaixonamos por alguém. Quando nos apaixonamos, deixamos, pelo menos de vez em quando, de ser o centro do universo, e cedemos ao outro esse lugar. Deixamos de ser o sol e passamos a ser a lua.
Mas isto, realmente, não responde à nossa questão. Não podemos apaixonar-nos por toda a gente! E o Bom Samaritano não se apaixonou pelo homem ferido! A pergunta é, pois, o seguinte: Que teremos que fazer para nos deixarmos tocar por quem mal conhecemos ? O Samaritano é tocado porque vê o homem ferido. O sacerdote e o levita também o vêem, não como alguém que precisa de ajuda, mas antes como uma possível fonte de impureza. Voltaremos a eles mais tarde.
O primeiro desafio é olhar com olhos de ver. Em todas as sociedades há os que ocupam a ribalta e os que ficam na sombra. Na nossa sociedade quem aparece são os políticos, as estrelas de cinema, os cantores e os futebolistas. Aparecem nos lugares públicos, na publicidade, e nos écrans da televisão, mas os pobres tornamo-los invisíveis. Desaparecem das listas eleitorais. Não têm voz nem rosto. E os imigrantes clandestinos nem ousam mostrar-se! Se não tiverem papeis, têm mesmo de se esconder. Têm de aprender a arte da camuflagem.
Esconder o pobre
Quando o Papa visitou a República Dominicana, o governo construiu um muro ao longo da estrada do aeroporto até ao centro da cidade para o impedir de ver os bairros degradados onde viviam os pobres. O povo chamou-lhe “o muro da vergonha”. Será que ousamos olhar, com olhos de ver, os nossos pobres e deixar-nos tocar por eles? Quais são os muros da vergonha que levantamos na nossa sociedade para esconder os pobres?
E o Samaritano aproximando-se cuidou-lhe das feridas deitando nelas azeite e vinho; colocou-o no seu próprio cavalo e levou-o a uma estalagem e tratou dele. No dia seguinte, tirou dois denários e deu-os ao hospedeiro dizendo: Trata dele, e quanto gastares a mais, na volta to pagarei.
Sentir-se tocado não chega. A compaixão cansa-nos! Vemos nos écrans das nossas televisões milhares de imagens de homens, mulheres e crianças, feridos e a morrer, caídos à beira das estradas. Como reagir a tanta miséria?
Correr o risco
A compaixão do Samaritano transtorna os seus planos. Preparara-se para a viagem com comida, bebida e dinheiro. No entanto, usa tudo isso para um fim que não tinha imaginado. Dois denários era muito dinheiro, o suficiente para pagar mais de três semanas de estadia com pensão completa. Dá mesmo o que não tem, o que contava vir a ganhar em Jericó. Arrisca fazer uma promessa em aberto que não sabe onde o levará.
Quando o doutor da lei pergunta: “Quem é o meu próximo?” o que ele pretende é definir as suas obrigações. Quer saber com antecedência o que precisa ou não fazer. Mas a resposta do Samaritano leva-o para um terreno desconhecido. Não pode saber quanto o estalajadeiro vai pedir. Há um velho ditado que diz: “Se queres fazer rir Deus, conta-lhe os teus planos.” A verdadeira compaixão transtorna os nosso planos, e lança-nos no imprevisto. Se ousarmos olhar com olhos de ver os pobres, os feridos, os estrangeiros, os marginais que vivem à nossa beira, não saberemos que consequências isso poderá trazer à nossa vida.
‘Qual dos três te parece ter sido o próximo daquele que caiu nas mãos dos ladrões?’ O doutor respondeu: ‘Aquele que usou de misericórdia para com ele’. Então Jesus disse-lhe: ‘Vai e faz o mesmo’.
Já vimos que o doutor da lei faz uma pergunta que o põe, a ele, no centro, e Jesus responde com uma pergunta que põe o outro no centro. Mas há mais. O doutor da lei pergunta quem é o seu próximo. Parte do princípio que já temos próximos, mas devemos saber quem eles são. E Jesus responde-lhe perguntando quem se tornou o próximo do homem que caiu nas mãos dos ladrões. O Samaritano faz-se um próximo daquele homem. Cria com ele uma relação que não existia antes.
“Vai e faz o mesmo”. Estas palavras são um convite a construir uma sociedade que ainda não existe. Uma política cristã é algo mais do que a organização da sociedade e a regulamentação de interesses em competição. É o ansiar por uma comunidade em que o diferente, o estrangeiro, o pobre sejam verdadeiramente os nosso próximos. Aponta na direcção do Reino. Ao contrário do comunismo, nós, cristãos, não acreditamos que podemos, por nós mesmos, construir o Reino. O Reino virá como um dom imerecido e que ultrapassa a nossa imaginação. Mas a nossa política em busca de comunhão com os outros, abre-nos as mãos para recebermos esse dom. A política foi definida como “a arte do possível”. A política cristã é marcada pela esperança do que muitos consideram o impossível. Queremos correr o risco de ousar realizar uma comunhão que está para além das nossas capacidades. A política cristã é a arte do impossível.
Cada um de nós
Em última análise, isto significa perdermos o que secundariamente nos identifica e que nos separa uns dos outros. A parábola fala de uma viagem que transforma a identidade dos participantes. O homem assaltado pelos ladrões é simplesmente chamado ‘um certo homem’. Não se diz se é judeu ou samaritano, inglês ou italiano. Ele é cada um de nós, qualquer ser humano. E quando Jesus pergunta quem se tornou o próximo do homem que caiu nas mãos dos ladrões, o doutor da lei não responde, “Foi o Samaritano”. Apenas diz, “Foi o que mostrou misericórdia para com ele”. Também o Samaritano foi libertado da identidade secundária de herético. O relato começa por ser uma história de Judeus e Samaritanos e termina sendo a história de dois seres humanos. Os que guardam a sua identidade original são os que se limitam apenas a passar adiante, o sacerdote e o levita. Perdem a oportunidade de descobrir uma nova forma de se ser humano. Passam adiante, mas continuam amarrados à sua antiga identidade.
Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Isto significa muito mais do que amar o próximo tanto como a nós mesmos. Somos convidados a amá-lo como parte de nós mesmos. Amamos os membros da nossa família como a nós mesmos, porque eles fazem parte do que somos. Somos da mesma carne e do mesmo sangue. Amar o estrangeiro como a mim mesmo é descobrir uma nova identidade que me transforma. O Samaritano pratica o que chamamos caridade, mas no antigo sentido da palavra3. Até ao século dezassete, pelo menos em inglês, ‘caridade’ significava os laços que nos ligam uns aos outros como membros do Corpo de Cristo. Depois do século dezassete, com a grande alteração que sofreu o modo de percebermos a nossa humanidade, veio a significar, principalmente, a esmola que damos aos pobres. Deixou de exprimir o amor dos nossos irmãos e irmãs e acabou por significar a ajuda oferecida a estranhos.
O meu irmão, o pobre
Assim, amar o meu próximo como a mim mesmo é lançar-me no caminho. O caminho conduz, não apenas de Jerusalém a Jericó, mas ao Reino onde descobrirei, plenamente, quem sou. É uma viagem que me liberta de tudo o que secundariamente me identifica, e me configura com Cristo. Como diz o apóstolo S. João: “Ainda não se manifestou o que havemos de ser, mas sabemos que quando Cristo se manifestar, seremos semelhantes a ele porque o veremos como ele é” (I Jo 3:2).
Como ousaremos empreender essa perigosa caminhada para o Reino? Como ousaremos partir de Jerusalém para Jericó? Podemos ser assaltados por ladrões e deixados meios mortos. Podemos encontrar algum homem ferido e esse encontro mudar as nossas vidas. Não será mais seguro ficar em casa? Não. Afinal, podemos ousar enfrentar ‘o caminho’ porque Deus nos precedeu. Foi Deus quem saiu de Jerusalém para Jericó e nós podemos seguir sem medo.
O Levita e o Sacerdote, estavam indo ao templo, ansiosos por adorar a Deus, servi-lo proferindo um belo sermão o oferecer-lhe canções, levar o povo a refletir sobre os propósitos de Deus. O incrível é que eles mesmo estavam distante da vontade do Pai.
Que neste novo ano seja nossa primeira prioridade, sermos fonte de bênçãos aos que estão a nossa volta, aos nossos próximos, e não apenas buscar a benção de Deus para podermos brilhar como Moisés após receber de Deus as Tábuas da Lei. Pois como disse Jesus: “NISTO TODOS SABERÃO QUE SOIS MEUS DISCÍPULOS: SE VOS AMARDES UNS AOS OUTROS”. E juntando-se a isto o conselho do apóstolo Paulo, que seja “UM AMOR NÃO FINGIDO”, EM 2010 EU QUERO MUITO ABENÇOAR SUA VIDA E A DE MUITAS OUTRAS PESSOAS. VOCÊ QUER SE JUNTAR A MIM (NÓS)?
Pastor Lessa Júnior
12/08/10 17:32